I
(...)
Matar o olho culto herdado das tradições da
opressão ocidental sobre nós
Abrir nesta noite regional um outro olho, nativo.
Essas são as práticas urgentes. De uma perspectiva
menos elementar, essa é a nossa fome mais urgente.
Contra o colonizador, nacional e estrangeiro, mas sem a miséria
da xenofobia rancorosa,
e insistindo nos valores da insolência e da transgressão
II
Nosso
nascimento como região depende de uma morte? Sim. Da
nossa morte como miragem de região.
E, por isso, e para isso,
então,
temos: Posição: contra o regionalismo e ao mesmo
tempo por uma revolução de região, só
o mito e o delírio poderão alguma coisa.
E todos os sentidos advertidos contra os engodos de uma História
feita contra nós, por dominadores contra dominados.
III
(...)
O real a nossa volta é, na Amazônia, socialmente,
a transplantação da cultura forjada pelo dominador,
herança a que nos forçam.
Alguém já disse: "Do fundo de uma prisão,
um homem pode fechar os olhos e destruir o mundo."
É disso, enfim, que se trata. Desse poder. E nós
o temos, mas ele dorme entorpecido o nosso sonho de região,
sem identidade, sem alma - porque fomos desalmados pelo invasor.
(...)
A Amazônia é uma irrealidade, então? Uma
utopia? Um fantasma geográfico habitado por fantasmas
humanos? É?
IV
Juntamente
com a mobilização de uma operação
política, então, é preciso pôr
em movimento uma operação mágica.
Esta: para além do real que me é dado pelo mundo,
e sobretudo se esse real está deformado pelas marcas
de uma dominação alheia a mim,
resta-me o recurso de um jogo.
E nesse jogo descubro e me repito, até o último
alento:
- A História, a minha história, só terá
realidade quando eu me apossar dela pelo meu imáginário
de homem e região.
(...)
V
Nesse
imaginário, é esta região na verdade
quem fala, e, através dela, falaremos todos nós.
Bastará deixar que ela nos diga algo. E escutar. Com
muita humildade. Muita radical exasperação também.
E sonhando bastante os nossos sonhos, a todo instante. E deixando
que esses sonhos, os individuais, se misturem com os sonhos
da região. Porque, no fundo, só uma coisa sonha
e nos sonha: a vida.
É preciso dar-se, deliberadamente, a ela.
E é preciso insistir:
- Nossa História só terá realidade quando
o nosso Imaginário a refizer, a nosso favor.
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