O PoemaO Poema

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Vasko Popa, nascido em 29 de junho de 1922, em Grébenatz, na Sérvia, é um dos mais representativos poetas contemporâneos da Iugoslávia. Suas obras já foram traduzidas para mais de 19 idiomas, sendo considerado uma figura marcante no cenário poético internacional.

"Poeta de linguagem descarnada, minimalista, pesquisador da forma, Vasko Popa, contudo, é mais do que esses rótulos que, de certo modo, apenas resumem parte de seu trabalho poético."

(trecho da apresentação escrita por Aleksandar Jovanovic, para o livro de
Vasko Popa: "Osso a Osso" - Editora Perspectiva - 1989)

 

 


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Casca, 1953

O Campo do
Desassossego, 1956

Paracéu, 1968

A Terra Ereta, 1972

Sal Lupino, 1975

Carne Viva, 1975

A Casa no Meio
do Caminho, 1975

Corte, 1981

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Vasko Popa
Vasko Popa
Haroldo de Campos e Vasko Popa
Vasko Popa
Haroldo de Campos, Vasko Popa e Nelson Asher

DENTE DE LEÃO

Na beira do passeio
No fim do mundo
Olho amarelo da solidão

Cegos pés
Apertam-lhe o pescoço
No abdômen de pedra

Cotovelos subterrâneos
Empurram suas raízes
Para o húmus do céu

Pata canina ereta
Faz-lhe troça
Com o aguaceiro recozido

Contenta-o apenas
O olhar sem dono do passante
Que em sua coroa
Pernoita

E assim
A ponta de cigarro vai queimando
No lábio inferior da impotência
No fim do mundo

(tradução: Aleksandar Jovanovic)

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TREPADEIRA


Filha mais doce
Do verde sol subterrâneo
Fugiria
Da barba branca da parede
Se ergueria em plena praça
Vórtice envolto em sua beleza
Com sua dança-de-serpente
Fascinaria tempestades
Mas o ar de amplas espáduas
Não lhe estende as mãos

(tradução: Aleksandar Jovanovic)

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MUSGO

Sonho amarelo da ausência
Do alto das telhas ingênuas
Aguarda

Aguarda para descer
Sobre as pálpebras fechadas da terra
Sobre as faces apagadas das casas
Sobre as mãos apaziguadas das árvores

Aguarda imperceptível
Para a mobília enviuvada
Abaixo no quarto
Revestir cuidadoso
De uma capa amarela

.(tradução: Aleksandar Jovanovic)

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NO SUSPIRO

Pelas estradas da profundeza da alma
Pelas estradas azul-celeste
A erva-daninha viaja
As estradas se perdem
Sob os pés

Enxames de pregos violentam
As plantações cansadas
As lavouras desaparecem
Do campo

Lábios invisíveis
Apagaram o campo

A dimensão triunfa
Encantada pelas palmas de suas mãos lisas
Cinzalisas

.(tradução: Aleksandar Jovanovic)

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NO FINAL

Osso eu osso tu
Por que me engoliste
Não me vejo mais

O que tens
Tu é que me engoliste
Não me vejo a mim também

Onde estou agora

Agora não se sabe
Quem está onde quem é quem
Tudo é sonho horrível da poeira

Será que me ouves

Ouço a ti e a mim
O canto do galo canta em nós

.(tradução: Aleksandar Jovanovic)

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CARACOL ESTRELADO

Deslizaste depois da chuva
Depois da chuva de prata

As estrelas com seus ossos
Sós construíram-te uma casa
Aonde a levas sobre uma toalha

O tempo capenga te persegue
Para alcançar-te para esmagar-te
Estende os chifres caracol

Te arrastas por uma face gigante
Que jamais hás de fitar
Direto para a boca do nada

Retorna à linha da vida
À minha palma de mão sonhada
Enquanto não é tarde demais

E deixa-me como herança
A toalha mágica de prata

( tradução: Aleksandar Jovanovic)

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AULA DE POESIA

Sentamos no banco alvo
Sob o busto de Lenau

Nos beijamos
E de passagem falamos
Sobre versos

Falamos sobre versos
E de passagem nos beijamos

O poeta vê algo através de nós
No banco alvo
No pedregulho do caminho

E silencia
Com seus belos lábios de bronze

No Parque da cidade de Vrchatz
Aprendo lentamente
O cerne da poesia

( tradução: Aleksandar Jovanovic)

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CRÍTICA DA POESIA

Depois da leitura de poemas
No serão literário da fábrica
Começa o diálogo

Um ouvinte ruivo
De face marcada por manchas solares
Ergue dois dedos

Camaradas poetas

Se eu lhes versificasse
Toda a minha vida
O papel ficaria rubro

E pegaria fogo

( tradução: Aleksandar Jovanovic)

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SÃO SAVA

Em torno de sua cabeça voam abelhas
E constróem uma auréola viva

Em sua barba ruiva
Forrada de flores de tília
Trovões e relâmpagos brincam de cabra-cega

Em seu pescoço pendem correntes
E balançam no sonho de ferro

Em seu ombro um galo reluz
Nas mãos um cajado sábio canta
A canção dos caminhos cruzados

À sua esquerda corre o tempo
À sua direita corre o tempo

Ele caminha pela estiagem
Seguindo os seus lobos

( tradução: Aleksandar Jovanovic)

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QUARTZO

para Dúshan Ráditch

Sem cabeças sem membros
Aparece
Com o emocionado pulso das ocasiões
Move-se
Com o passo atrevido dos tempos
Tudo cinge
Em seu terrível
Interno abraço

Tronco liso branco exato
Sorri com a sobrancelha da lua

( tradução: Aleksandar Jovanovic)

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MONUMENTO AO OXIGÊNIO

um vinho rubro-terra me destina
a este país-braços-abertos
do coração do qual frondeja
a árvore da vida de olhos verdes

respira e assim anima
— exânime — uma estrela

me aterrorizam monumentos
grandes fantoches sobreerguidos
com frio e fogo e outras — invisíveis — armas

em parte alguma jubilou-me
um monumento ao oxigênio

todo armado de folhas
de flores e de frutos
e de outras verdades maduras


( Transcriação de Haroldo de Campos,
com a colaboração do Autor
.)

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