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Guardo
fotografias entre as páginas de um livro
e alguns recortes em forma de pássaros que
me parecem raros,
pássaros que nunca vi, espaços entre
as asas do que não sei.
À
minha frente, um quadro na parede, uma cortina aberta
e outros ângulos retos além das flores
claras sobre a mesa.
Fique
com as flores. Enfeite as tardes com palavras vivas.
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Não
vou recortar as palavras como tu
deixaste as mãos e a faca para mim.
Porque nunca quiseste as promessas
a primeira impressão é de coragem
ou de orgulho ou desconhecimento.
Sobre mim e a mesa
o lustre abre-se em rendas para que o tempo inexista.
Com
a chuva, eu sei que é frio demais e é
noite,
eu continuo aqui, dentro da casa.
A água talvez seja uma resposta, a minha,
talvez eu ainda espere muito de mim,
eu quero arrumar os móveis quase em círculo
e que não se procure entender como um poema
ou como indício, o que eu abandono. |
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O
mar afunda em si,
repete.
Eu seria como ele
se ele sentisse que é infinito.
Não
sendo alegre ou triste,
o mar afunda em si,
repete.
Ele seria como eu
se em mim nadassem peixes.
Crio
o que quero,
mantenho ou modifico.
Havendo uma tempestade sobre o mar,
ele se torna ainda mais mar. |
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Noite
desigual,
a tua voz encobre o que acontece.
Durmo sobre ti e acordo
inúmeras vezes sobre ti.
Portas
batem-se às minhas costas
porque a casa é feita do que esqueces.
Se meus sonhos coubessem em uma das minhas mãos,
calarias?
Posso
imaginar a vida como uma seqüência de
alegrias,
embora eu tenda a estar triste.
Posso imaginar quase qualquer coisa:
muros altos em volta de uma cidade feita do que
sou,
muros também eu.
Digo,
por isso, dos sonhos, que eles mantêm as minhas
mãos vazias.
A noite, em murmúrios, me favorece,
ela é o que me ocorre se não penso
em mais nada,
se, não precisando escolher uma resposta,
guardo-me várias. |
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ainda
leio cartas de manhã
escrevo cartas
não sou assim tão complicada
às vezes vislumbro quem sou
olho
pela janela e confirmo coisas como chuva
me preparo para os acontecimentos
alterno os dias com as cores das roupas
gosto mais de preto ou de azul
tento
continuamente acompanhar o que penso
é muito bom saber que penso o que penso
algumas dúvidas aceitáveis
preto
azul
entre
o céu e a terra
olhos descansando sobre um pássaro |
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O
céu dita tuas cores e a areia deita sob ti.
No mais, também és como o mar,
ondas descalças, anáguas rendadas de
um mar surpreendentemente humano.
Conchas te anunciam
com propriedade.
Elas e as algas substituem quem te acompanhasse.
Quanto a mim, ainda
que não saibas,
abro espaços a ossos e flores
que porventura se acrescentem às aguas.
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Rosângela Darwich
rosangeladarwich@yahoo.com.br
tel 55 91 8816 8243 |
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