tocaiúnas

 

este verso vem do meu Mar:
o Tocaiúnas
tecelado entre verbos
                                        e  manhãs
chega medrando a beira
no ato de tecer
& destecer
                                 o horizonte
inundando pra lavar o tempo
essa eterna lenda infindável

o Tocaiúnas
                                 ora manso
                                                            ora bravio
traz a luta
ao lamber a cidade
da partida e não ida
da volta e da memória
de quem não foi domado
e carrega a alegoria
do espaço entre
a felicidade e a infelicidade

o  Tocaiúnas é a nossa
alma em calmaria.

 

 

humanitas

                      para o poeta Paulo Leminski



a poesia
torna mais humanos
                                 humanizando
                                 humanitários
os humanos desumanizados
por outros humanos
                                 canibais.

 

 

o que fazer com as exatidões
                                             dos verbos?
de tudo o que se passa
                                                         ao lado?
nada?

o que fazer se as metáforas
                                            me exaustam?

são discursos os sonhos agora.

 

o que fazer com os olhos que
                                             me espreitam?
com a boca que me difama?

 

sim... sim ... sim; eu delato!

 


 

o que significam as flores
                                             na dureza dos dias?

entre pedras
                                             cores

entre gestos
                                             solidão.

 

 

o rumo é de amianto
& parece insegura tua força
de esculpir distâncias

tem oculto um lado
inacessível da infância
uma pátria de pranto irrepatriada

já sei
sou um timoneiro em terra firme
que desaprendeu como rumbear

tenho em mim que a essa hora
meu veleiro sofre de ausência
ele abandonado a margem
e, eu perdido, entre casas
de portas e janelas trancafiadas.

 

 

não saio impune
esse dia nos ensinastes
a revelia de protestar
num sentimento de querer outros dias

volto para casa ocioso
deixando em cada esquina
a singeleza

avizinho meu coração segregário
na tentativa de convergir
rumo a um convento

quero a mudez de teus olhos
a selvageria silente de tua boca
e o som que batuca em teu peito

a noite vem vindo...

apresso os passos
& temo as fantasias
que vêm de mãos dadas
com escurejar.

 

 

como posso compreender meu drama,
se sou mais perpendicular para borboletas,
que para passarinhos?

mas, vem você falar-me
do canto dos pássaros

lamentavelmente eles nunca saberão
do silênCIO das flores

resigno meu drama
pelo indizível que têm
as flores e as borboletas

dependuro meus males
no quaradouro dessa duvidosa manhã:
quero quarar a vivência!

 

 

 

trancafiemos as portas e janelas
com cuidado meu amor

com o cuidado igual
ao que zelamos de um
doente implorando a vida

receio a noite
porque ela tem uma mania estranha
de aprofundar os cômodos

sem alarde
passe os ferrolhos
com cautela

a noite é um medo faminto

deixei uma bandeira branca
no desejo de fixar no alpendre
nas primeiras  horas de amanhã

não afrontaremos a penumbra
a nossa indigência
requer manhãs

encarceremos neste recinto
nossa ânsia de cores
que o amanhecer ainda vai demorar

tranque as portas e janelas, meu amor
vem, que a única coisa boa da noite
                                   é o nosso amar.

 

Airton Souza
souzamaraba@gmail.com